quinta-feira, 15 de março de 2012

Apenas mais uma história trágica


           Tinha 5 anos bem vividos. Mergulhada no próprio mimo, nariz em pé, perdida em ideias e um mundo inteiro a descobrir. Brincava de princesa, heroína e até lutava com dragões. Não ligava para ninguém, até porque ninguém realmente ligava para ela.
           Aos 10 anos descobriu coisas da vida que muito adulto nunca vira e nem precisara presenciar. Foi largada, abandonada; estava sozinha. Encontrou refúgio e companhia em seu inconsciente, trouxe para sua realidade aquilo que bem entendera e quisera. Deixou-se levar pela tristeza: afinal, ninguém ligaria para ela.
           Chegou aos 15 de um jeito que nunca imaginara. Corpo possuído, inocência deflorada. Agora brincava com outro tipo de heroína e se entregava sem pudor. Sobrevivia alucinada, carregava um vazio infinito nos olhos e coletava prazeres momentâneos. Continuava sem se importar, já que na manhã seguinte ninguém ligaria também.
           Com 20 anos já não era mais nada. Sexo, drogas e, se desse tempo, rock n' roll. Arranjara amigos da pior qualidade que ao menos mantinham um sangue sujo correndo pelas suas veias. Seu coração ainda batida, mas já estava oca há tempos. E se ela não ligava, por que mais alguém ligaria?
           Finalmente foi encontrada aos 25 por um cara legal. Este tocou-lhe a face gélida e até mesmo gostou do que viu. Não conseguira perceber o passado podre, sujo e fétido que o corpo dela exalava, mas sentia que deveria ajudá-la. Ironia do destino que a ajuda tenha batido em sua porta quando já era tarde demais. Os olhos fechados e a pele gelada indicavam que ali já não havia mais pulsação.
           E quando alguém poderia finalmente se importar, o jogo chegou ao fim. Morreu com o cigarro entre os dedos e sem ninguém ligar.

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